PLANO FRUSTRADO
Por Carlos Alberto de Sousa, engenheiro agrônomo
Quando nos detemos sobre a pujança do agronegócio brasileiro, logo deparamos com o seguinte questionamento: o que torna o segmento tão bem-sucedido no Brasil? Que fatores contribuem para isso?
Quatro grandes fatores são responsáveis por esse sucesso. Dentre eles, podemos mencionar alguns, como a abundância dos nossos recursos naturais; os sucessivos ganhos de produtividade observados nas explorações, fruto da pesquisa e da tecnologia; e o empreendedorismo dos nossos produtoresrurais.
Nesse elenco de fatores, um outro não pode ser desprezado: o apoio governamental através da política agrícola de crédito rural. O desempenho histórico da safra brasileira de grãos muito deve a esse instrumento que tem contribuídosignificativamente para o sucesso do agronegócio nacional, cujo Produto Interno Bruto (PIB) representou em 2023, 23,8% do PIB do País, não obstante a queda de 2,99% observada por conta, principalmente, das adversidades climáticas ocorridas naquele ano (dados do Cepea de 26/03/2024).
No que tange a essa política creditícia direcionada ao setor, emque pese a cada plano safra o governo acenar com mais recursos para o financiamento das atividades, no entanto vem se observando nos últimos anos uma acentuada concentração dos empréstimos em programas de crédito que utilizamrecursos livres dos agentes financeiros, cujas taxas de jurossuperiores a 17% ao ano (taxas praticadas atualmente pelos agentes financeiros) impedem o acesso dos pequenos e médios produtores ao crédito rural, notadamente aqueles inseridos noSemiárido brasileiro. Nessa região, são raras as explorações rurais que suportam encargos financeiros tão elevados.
Linhas de financiamento como, por exemplo, a do Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural (Pronamp), que beneficia produtores rurais com renda bruta anual de até R$3 milhões com taxa de juros de 8% ao ano, e cuja previsão de desembolso no Plano Safra 2023-2024 é de R$61,4 bilhões, logo nos dois primeiros meses de vigência do Plano teve seus recursos esgotados. Em face disso, os produtores enquadráveis nesse programa que necessitavam desses recursos tiveram que recorrer a outras linhas com encargos financeiros muito mais elevados.
Nos financiamentos praticados na vigência do Plano Safra 2021-2022, em que o desembolso atingiu R$315 bilhões, o montante dos recursos financiados a taxas livres foi de R$137,22 bilhões. No Plano Safra 2022-2023, o total de recursos livres desembolsados chegou a R$ 154,68 bilhões, de um volume total aplicado de R$359 bilhões. Nesse momento, a dois meses do final do Plano Safra 2023-2024, já foram aplicados R$168 bilhões de recursos livres, dos R$364 bilhões anunciados para o referido ano agrícola (ver Matriz de Dados do Crédito Rural do Banco Central em www.bcb.gov.br).
Os números acima revelam que o aporte financeiro do crédito rural governamental com recursos livres cresce a cada novo Plano Safra, medida que se de todo não é tão ruim, pois, afinal, são mais recursos para compor o funding de financiamento do setor rural, mas que, no entanto, deixa frustrados os pequenos e médios produtores rurais do nossopaís.
Almeja-se que o Plano Safra 2024-2025, que daqui a poucos dias será anunciado, contemple mais recursos para esse segmento de médios produtores e contenha dispositivos para resolver alguns problemas que já há algum tempo vêm tirando a tranquilidade de parcela significativa do contingente de produtores desse país, como é o caso dos produtores de leite, em que o enorme volume de leite importado da Argentina e do Uruguai acarretou o recuo de 21% no preço do leite recebido pelos produtores ao longo de 2023 e 2024, além da queda de 67% na margem bruta da atividade, o menor valor já registrado desde 2017.